Contos, reflexões, ensaios... tudo em prosa. Com um generoso toque de sentimentos.

sexta-feira, 16 de janeiro de 2009

Indagações 2 ou Solidão p.4

A casa de Leon era magnífica. Decorada de maneira clássica, bege e bordô. Quadros, cortinas, tapetes... Impressionava.
As estantes estavam lotadas de títulos maravilhosos.  Nunca realizara que Leon havia ganhado tanto dinheiro. Agora via de maneira nítida que sua vida era, de fato, melhor que a minha e de Pietro. Vivemos de maneira digna, mas há tempos não conseguimos viajar.

Assim que respondi a carta de Hélène, ela mandou-me nova com o endereço de Leon. Eu não sabia como os dois haviam relacionado-se, e não sabia porque Hélène queria me ajudar a encontrá-lo. Disse a Pietro que iria dormir na casa de Malena, uma amiga. Iríamos passar uma noite apenas nós duas, bebendo e conversando. Ele desconfiara, claro, não obstante não apresentou nenhuma objeção. Vesti-me com minha melhor roupa. Um vestido azul, com um sobre-tudo vermelho. No cabelo um turbante, também azul.
Peguei um ônibus, e fui. Meu coração batia forte. Estava assustada, empolgada, ansiosa. Sempre fui ansiosa.
Era tudo o que eu precisava. Minha carência seria suprida. Mas...
Havia, contudo, a possibilidade de Leon não gostar de minha atual aparência. Por isso a ansiedade apoderava-se tanto. Ainda assim, nossa relação nunca fora tão superficial a ponto de ligarmos para roupas, ou aparência... Reconheço que nós éramos bonitos, assim como Pietro também. Porém não era a base de nossa relação. Pietro mesmo reclamava quando me vestia de maneira mais exuberante.

O ônibus chegou a estação de trem. Ele iria me deixar no estação onde Leon estaria me esperando. Confesso que a estação lotada me deixou em pânico. Se alguém me visse poderia dizer a Pietro, que sabe que Malena mora em outra parte da cidade. Isso iria desgastar ainda mais a confiança que tínhamos um no outro. Andei rápido e olhei para baixo. Estremecida e anestesiada. Andei pela chão e pelas pessoas sem vê-las ou senti-las. Subi no trem e pûs-me dentro de uma cabine. Ainda nervosa, ainda ansiosa, ainda preocupada. Quantas sensações ao mesmo tempo. Aquilo deixou-me alegre. O perigo que havia tempo que não me assustava. Gargalhei, sozinha na cabine, e respirei fundo.

- Por quê ficou todo este tempo sem procurar-me?
- Sabia muito bem que não havia maneira de separar-me de Marccelo.
- Poderíamos ter criado Marccelo juntos. Pietro confidenciou-me certa vez sua impaciência com crianças, e seu medo de ter filhos.
- Pietro foi um bom pai. Não posso reclamar. Aliás, Leon, não sou a única culpada por nosso afastamento. Respondi todas suas cartas, elas que cessaram.
- Claro. As respostas sempre tão lacônicas. Desinteressadas e desinteressantes. Como responder algo tão digno de finalização?
- Tem que me entender, Leon... Ainda amava Pietro. Não tive outra escolha.
- Amava dois homens ao mesmo tempo?
- Não existe apenas uma maneira de amar, Leon, amei os dois de maneiras diferentes.
- E qual era o maior? O maior de seus amores?
- Obteve sua resposta há 20 anos atrás.
- Pietro?
- Marccelo e Pietro.
- Então responda-me, Giulia, por que esteve na estação hoje?
- O amor se desgasta. Marccelo está morando na Espanha. Pietro nunca fora muito de falar. Estive sentindo-me sozinha.
- E Pietro? Como vai?
- Trabalha feito um cavalo. E bebe muito, também.
- Continua teimoso?
- Além da aparência e do itinerário, nada mudou em Pietro. Continua exatamente o mesmo.
- Então ainda me odeia?
- Não acho que ele te odeie, Leon. Acho que houve uma decepção. Nossa conduta não foi a melhor.
- Pensei em escrevê-lo. Dávamos-nos muito bem.
- Sim. Víamos de longe como se completavam.
- E você era nossa ligação maior. O amor que sentíamos por você que nós ligara.
- Não aprovo essa definição. Eu fui o que separou vocês, e não o que ligou.
- Venha viver comigo. Nesta casa!

Leon estava na estação quando cheguei. Protegido do frio com um cachecol e um blaser. Cabelos brancos que realçavam seus olhos azuis. Continuava lindo, e sorria ao ver-me.
No dia seguinte nos despedimos com certa dor, e levou-me ao trem.

Um comentário:

B disse...

E quando sai o livro?? ;]
Fiz o blog... finalmente...
Se cuida, menino... qualquer coisa, grita.
Bjão.